sexta-feira, 29 de junho de 2012

As quatro vidas (da casa) da Margarida


"... dói-nos tudo. (...) Ontem apanhámos todos os limões amarelinhos. Quilos e quilos e quilos..., vou oferecê-los, como tenho feito. Mas o Limoeiro fica carregadíssimo de centenas de outros, ainda verdes, de todos os tamanhos. Logo agora é que ele havia de querer explodir...

E as videiras?! Bem..., são tantos os cachos de uva (branca), que dá dó deixar aquilo tudo para trás...


As roseiras também se lembraram agora de ficar ainda mais estupidamente lindas e por mais que traga rosas às braçadas, no dia seguinte estão lá outras, a rir-se de nós...
Acho que o quintal nunca esteve tão pujante e viçoso. Uma injustiça, que nos mata o coração.
 

À minha mãe porque criou tudo de pequenino do nada e eu porque sei (mas não lhe digo) que quem comprar aquilo vai terraplanar para fazer anexos e outras 'benfeitorias', e vai tudo 'de charola', porque não representa nada para mais ninguém, e as pessoas, em geral, são insensíveis à natureza.

Trouxe um pedacinho do chão de cimento do quintal, que se soltou à minha frente (juro) parecendo querer constituir-se como recordação. E a chave do toilette, que é muito gira (a do meu quarto é banal). Já tirei mil fotos. A tudo. E ainda vou tirar mais, quando estiver vazia, antes de fechar a porta pela última vez.

 

A minha casa tem uma luz inigualável.

Os vidros martelados de há cinquenta anos irradiam a diferença e o sol da tarde inunda tudo, de uma ponta à outra.
O chão brilha e as escadas contam histórias nos desenhos das madeiras onde tanto subi, desci, brinquei, corri, escorreguei...

 



As paredes, que pintei algumas vezes, gravam a vida de décadas e se encosto o ouvido, deixam-me recordar as passagens mais felizes. E só essas. A minha casa é tão generosa que não permite memórias tristes, nem recordações de maldades e omissões.
Por isso falo com ela com amor e saudade e ela me ampara com o carinho que só um berço proporciona.

Por isso me dói tanto, tanto, tanto, ter de a deixar.
É mais do que uma casa, é muito mais do que paredes, madeiras, vidros, telhas.
E não o quereria de outra maneira, porque quem sofre assim, ama desmesuradamente.
E eu sou uma assumida alma de excessos (...)".



Este "desabafo" que recebi da minha amiga Margarida merece ser partilhado.

4 comentários:

  1. Olá Helena,

    Palavras lindas, sentidas, tristes. A Margarida escreve muito bem, especialmente quando as palavras lhe saem, assim, directamente do coração.

    E que bem ficam aqui, intercaladas com estas belas fotografias. Gostei mesmo muito de as ver aqui, nesta sua casa.

    Mas, enfim, são páginas que se viram.

    Eu hoje, lá no meu canto, ofereço-lhe uns brincos já que, para assinalar o momento, a Margarida tomou as medidas necessárias para os usar. E com brincos ainda o seu sorriso vai ficar mais bonito.

    Sensibilizada com o seu gesto para com a Margarida, desejo-lhe, Helena, um bom sábado.

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  2. :) E já foi bem partilhado, querida Helena! em princípio pelas almas que mais de perto têm acompanhado esta saga. E ainda pelas que mais amo.
    Está linda, a selecção de fotos!
    ...merci.

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  3. Minhas queridas Helena e Maggie
    Tanto sofrimento por uma casa que se deixa e sabe a nosso respeito mais que nós.
    Maggie, minha linda Maggie, guarde o sofrimento para as grandes dores da vida. Uma casa é só uma casa.
    A vida é muito mais que isso e a Maggie sabe-o muito bem. Levante essa cabecinha linda, ame-se a si própria, olhe-se no espelho, recupere a alegria e dê graças a Deus por estar viva!

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  4. As fotos estão divinais como as palavras da Margarida e a seleção acurada da Helena.
    Que bonito.

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