sábado, 14 de julho de 2012

14 de Julho

Manuel Tito de Morais, Mário Soares (e Ramos da Costa) à chegada a Santa Apolónia a 28 de Abril de 1974 e Hermínio da Palma Inácio (de bigode), libertado dois dias antes da prisão de Caxias.

No célebre "Comboio da Liberdade" vinha também o meu tio Fernando que fugira para Paris quando Hermínio da Palma Inácio foi preso pela PIDE em Novembro de 1973.
Assim que chegou a Santa Apolonia, o tio meteu-se num táxi rumo a casa. (A minha tia Ermelinda, que tinha ido com a Maria Barroso para Paris em Dezembro de 1973 para passarem o Natal com os maridos, só voltou a Lisboa no dia 1 de Maio).

Felissíssimo de estar, enfim, em casa, o tio telefonou-me para me pedir "um grande favor". Atravessei, a correr, a Travessa de Santa Quitéria, para onde tinha ido morar pouco tempo antes e encontrei-o imerso em espuma, deliciado a tomar um banho "a sério", coisa que não pode fazer em casa do amigo que o hospedara em Paris. Sentado ao lado da banheira, estava o X Calheiros, grande amigo e o primeiro a chegar.

O tio pediu-me se não me importava de alojar "uns rapazes da LUAR", que iam chegar do estrangeiro nos dias seguintes e que não tinham família em Lisboa. Disse que sim, excitada com a ideia de receber em casa dois ou três "guerrilheiros" da "Rive Gauche"...

Entretanto iam aparecendo mais amigos dos quais o Hermínio da Palma Inácio, o "Velho" para os amigos. Estávamos todos excitadíssimos de os ver e ouvir. Por sermos muitos, decidui-se ir jantar ao restaurante. Já na rua, surgiu um problema inesperado: nenhum dos presentes tinha dinheiro para pagar o jantar para tantas pessoas. O tio tinha gasto no táxi os poucos escudos que trazia, o Velho, como sempre, tinha os bolsos vazios e os mais "ricos" não tinham liquido suficiente. Foi o Riscado, amigo de longa data, que havia "passado" para Espanha o meu irmão António, o meu tio, o Palma e outros perseguidos pela PIDE, que nos levou a um restaurante amigo que "fiou" o jantar. 
Foi nessa noite inesquecível que conheci pessoalmente o Velho.

Nos dias seguintes começaram a chegar os rapazes da LUAR. Eram mais de 15! Acamparam -todos- no meu pequeno 3 assoalhadas durante os primeiros dias da revolução. Passada a efervescência, e fartos de dormir no chão, os que tinham familia nos paises onde estavam exilados foram-se embora. Outros ficaram semanas, outros meses. Outros anos. No fim, só ficou o Fernando, pai da minha filha Joana
.


Semanas depois num restaurante do Bairro Alto a comemorar o 25 de Abril : o Zé Paulo Silva Graça, a Ju,  o "Velho" (lindo, sem bigode), o "Comandante" no meio das minhas primas Carocha e Isabelinha. Também estavam: o tio, o Telo, o Riscado e outros que já não lembro; éramos tantos! 

Faz hoje 3 anos que o "Velho" nos deixou. Tenho muitas saudades dele. Tenho muitas saudades do tio e da tia Ermelinda.
Tenho saudades dos amigos do meu tio que já partiram. Desse belo tempo, os poucos  ainda vivos estão velhos, cansados e desgostosos.  

4 comentários:

  1. QUE BEM, NOTA-SE na saudade QUE AINDA RESPIRAM IDEAIS...
    Que bonitas as suas recordações e as suas vivências, além da forma sentida que as expressa.
    Abraço
    Isabel seixas

    ResponderEliminar
  2. QUE BEM, NOTA-SE na saudade QUE AINDA RESPIRAM IDEAIS...
    Que bonitas as suas recordações e as suas vivências, além da forma sentida que as expressa.
    Abraço
    Isabel seixas

    ResponderEliminar
  3. Amiga, apesar de doer como o raio, recordar faz bem.
    Que doa!

    Abraço.

    ResponderEliminar
  4. Comentário parvo: muitas garrafas de Mateus Rosé.
    Comentário político: era tudo a estrear e a democracia também
    Comentário sociológico: éramos novos e valia tudo.
    Excelente descrição. Devias falar mais destas "loucuras".

    ResponderEliminar